Sábado à noite. Falam-se pelo celular. Combinam de se encontrar no dia seguinte, quando a mãe voltar de viagem. Despedem-se saudosas. A filha pega a chave e sai. A mãe acomoda-se no sofá.
Tarde de domingo. Encontram-se como o combinado. A filha, emocionada, acarinha-lhe o rosto jovem. Contempla os fios curtos e grisalhos, marca registrada dos últimos tempos. Quer espiar as tatuagens que cobrem o corpo da mãe, mas não pode. Só há flores, a cor das flores, o cheiro das flores. Flores cobrem os desenhos dos braços, das pernas, do tronco. A filha dá-lhe um beijo e sai. A mãe demora-se onde está.
Segunda pela manhã. A filha acorda, embora não se possa dizer que tenha dormido. Passou a noite a recordar cada ano, a imaginar cada ano, a inventar histórias para cada um dos 49 anos da mãe. Na sala, esbarra com o jornal sobre a mesa do café. Lê a coluna do dia e revê rosto, cabelos, tatuagens – dos braços, pernas e tronco. A filha sorri tristemente e sai. A mãe irradia-se pela casa.
Um comentário:
Muito delicado e tocante esse texto!
Imagino que seja inspirado na partida inesperada da talentosa Fernanda Young. Gostei muito da síntese!
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