domingo, 27 de janeiro de 2019

Outra Vez?!

Mário lê em voz alta a notícia que acabou de ser publicada num site. Corro para o computador e abro o Google Maps. O nome da localidade onde aconteceu a tragédia me soara familiar. Olho a geografia mineira com atenção e logo descubro a estrelinha indicando o ponto exato da pousada em que estivemos em 2016. Em linha reta, e a pequena distância, confiro no mapa, encontra-se a Mina da Vale em Córrego do Feijão. No alto do morro, o reservatório de rejeitos de minério de ferro que acabara de se romper. Avalio a probabilidade da pousada ter sido atingida pela lama desgovernada. Para cada evidência, contraponho uma esperança: “é muito perto”, mas “a quantidade de resíduos foi menor em Brumadinho do que em Mariana, não vai se espalhar muito”; “as sirenes não tocaram”, só que “devia ter pouca gente na pousada no horário, assim é mais fácil organizar a fuga”... 

Fico sabendo que a área administrativa da empresa foi atingida, e a vila no entorno, também. As imagens não escondem a agonia da catástrofe que se repete: vidas perdidas, comunidades destruídas, ambiente em degradação. Outra vez?! Sim, outra vez! 

Além da revolta pela negligência dos responsáveis, uma incredulidade triste me invade. Relembro a nossa estada na região, cercada de alegria e arte, tranquilidade e autodescoberta. Em Inhotim, vive-se a potência, e a beleza, da atividade humana. 

Recordo-me, porém, de ter estranhado a estrada de terra que dava acesso à pousada. Era larga, sem buracos, bem batida, e com tráfego intenso de caminhões. Imaginamos que alguma grande empresa, por usá-la em sua produção, fizesse a manutenção da estrada (olha que beleza!, pensei ingenuamente), e só me preocupei com a possibilidade da poeira atingir as instalações nas quais ficaríamos hospedados. Como a pousada estava livre da poeira, esqueci a estrada, os caminhões, a produção em grande escala, e nem fiquei sabendo que a tal empresa era a Vale. Só agora, estas lembranças fazem um melancólico sentido. 

A tarde segue, a confirmação chega: a Pousada Nova Estância não existe mais, engolida pela lama desgovernada. Rendo-me às evidências: era perto, a quantidade de resíduos foi grande, não deu tempo de organizar a fuga.

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Foi com a viagem a Minas Gerais, em 2016, que inaugurei as publicações no Blog, o que me faz ter uma relação muito especial com as cidades visitadas. Para ler os textos em que registro esta viagem, siga os links abaixo: